Espaço Serivê: cuidado integral para a obesidade infantil
- Patricia Vieira e Maria Clara Vieira

- 29 de out.
- 7 min de leitura
Atualizado: 5 de dez.
No Espaço Serivê, o acompanhamento nutricional individualizado é aliado ao suporte da psicanálise, oferecendo um cuidado multidisciplinar para crianças e adolescentes que enfrentam a obesidade infantil.
A proposta integra família e aspectos emocionais, ajudando pais, filhos e responsáveis a construírem juntos hábitos saudáveis de forma leve e duradoura. Saiba mais!
A obesidade infantil já é tratada como uma pandemia global. Projeções da Federação Mundial da Obesidade apontam que, até 2035, mais de 20 milhões de crianças e adolescentes poderão conviver com sobrepeso e obesidade. A condição é resultado de uma combinação de fatores — genéticos, comportamentais e sociais — que se manifestam no ambiente familiar, escolar e comunitário. Entre os principais responsáveis pelo crescimento alarmante estão o consumo de alimentos ultraprocessados, o sedentarismo e o excesso de tempo diante das telas. Para além dos riscos à saúde física, a obesidade infantil também reflete a dinâmica familiar, na qual os pais exercem influência decisiva sobre as escolhas alimentares e os hábitos dos filhos. Foi diante desse cenário que nasceu a proposta do Espaço Serivê, dedicado ao tratamento multidisciplinar da obesidade infantil, com uma abordagem que envolve tanto pais quanto filhos.
À frente do projeto estão Patricia Vieira, psicopedagoga e psicanalista, e sua filha Maria Clara Vieira Paschoal, nutricionista. Unidas pela experiência profissional e pela missão de promover saúde e bem-estar para as novas gerações, elas compartilham aqui um pouco da sua trajetória e das práticas adotadas na clínica.
Saiba mais sobre quem está à frente do Espaço Serivê:
Patricia Vieira – Pedagoga formada pela PUC-SP, psicopedagoga pelo Instituto Sedes Sapientiae e psicanalista, membro efetivo do Departamento de Formação em Psicanálise do mesmo instituto.
Pós-graduada em Transtornos Alimentares pelo Instituto ESPE, Patricia também é organizadora do livro Medicação e medicalização e coautora de A escola para todos e para cada um e Campos clínicos, educacional e social: o pensamento de Silvia Bleichmar.
Atua como psicanalista clínica, supervisora clínica em psicanálise e professora do primeiro ano do curso Fundamentos da Psicanálise e sua Prática Clínica do Departamento de Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae.
Maria Clara Vieira Paschoal – Nutricionista formada pelo Centro Universitário São Camilo, com atuação focada na área materno-infantil. Pós-graduada em Nutrição Clínica Materno Infantil pelo ICr HCFMUSP e em Nutrição em Oncologia pelo Hospital Israelita Albert Einstein, atualmente é mestranda em Pediatria pelo HCFMUSP. Atua como nutricionista clínica em consultório particular e é voluntária no Instituto da Criança e do Adolescente do HCFMUSP, além de atender a Seleção Brasileira de Futsal Down. Possui cursos de aprimoramento em Terapia Nutricional na Síndrome de Down, dificuldades alimentares no TEA e capacitação em atendimento nutricional no atleta pediátrico, incluindo formação na Academia Clínica Espregueira, em Portugal.
Entre suas contribuições acadêmicas, publicou o resumo científico Comparação do perfil nutricional das papinhas industrializadas para crianças de 6 a 7 meses na 2ª edição do Congresso Europeu de Nutrição Materno Infantil.
Boa leitura!
Mais do que números, histórias: como a Serivê enxerga a obesidade infantil
Patricia e Maria Clara explicam que a proposta do Espaço Serivê vai além de um simples acompanhamento nutricional. “É um local de acolhimento sistematizado, baseado em nossas áreas de atuação, para trabalhar a obesidade na infância”, explica Patricia.
Para ela, os primeiros vínculos — como a relação mãe-bebê e a amamentação — influenciam diretamente a relação da criança com os outros e com o alimento, moldando parte de sua constituição emocional e psíquica.
Maria Clara reforça que a obesidade é uma doença crônica e multifatorial, que não possui cura definitiva, mas pode ser controlada com acompanhamento contínuo. “O tratamento da obesidade deve ser multidisciplinar, considerando todos os fatores que contribuem para a condição”, afirma.
Na prática, o trabalho da clínica integra diferentes dimensões: a psicanálise ajuda a compreender mecanismos de compulsão e a relação emocional com o alimento; a nutrição oferece orientações baseadas em evidências; e a família é incluída no processo, tornando-se parte ativa das mudanças de hábitos. “Nosso espaço oferece escuta e acolhimento, criando um ambiente de conversa e orientação para crianças e famílias”, resume Maria Clara.
Segundo Patricia, “um tratamento eficaz para obesidade infantil precisa integrar psique, corpo, nutrição, médico e família, especialmente quando se trata de crianças”. O foco do Espaço Serivê, portanto, é construir um cuidado integrado, que respeite a complexidade da obesidade e fortaleça os vínculos familiares.

Do primeiro contato ao acompanhamento contínuo: como funciona o cuidado na prática
No Espaço Serivê, o primeiro passo é compreender a demanda de cada família. “Geralmente, a criança chega até nós por indicação da família, de um médico ou, às vezes, da escola”, explica Patricia.
A partir disso, inicia-se uma entrevista detalhada com os pais ou responsáveis, para identificar o que eles buscam, qual é a queixa manifesta e quais questões precisam ser abordadas. Depois dessa conversa inicial, as profissionais definem o melhor caminho para cada caso.
“Queremos trabalhar a obesidade infantil de forma individualizada, respeitando o ritmo de cada família e da criança”, completa Maria Clara. O acompanhamento pode envolver sessões com os pais, com a criança ou ambos, sempre focando no comportamento alimentar, na educação nutricional e no suporte emocional.
Além do atendimento individual, o espaço oferece grupos educativos para pais e responsáveis, promovendo a troca de experiências e a disseminação de informações confiáveis sobre alimentação saudável e hábitos alimentares.
“Nosso objetivo é que seja um ambiente seguro para os pais e responsáveis aprenderem e compartilharem, sem formatos engessados ou pacotes fechados. Cada família tem flexibilidade para construir o seu próprio caminho dentro do acompanhamento”, afirma Patricia.
Os atendimentos podem ser realizados presenciais, online ou híbridos, conforme a necessidade e disponibilidade da família.
Maria Clara reforça: “O mais importante é passar informação correta e de qualidade, criando um ambiente de confiança para que os pais entendam melhor as questões ligadas à obesidade de seus filhos e aprendam a lidar com elas de forma prática e efetiva.”
Escuta, acolhimento e vínculos: a base do tratamento
Cada paciente do Espaço Serivê é visto como um indivíduo único, inserido em uma história de vida, com suas experiências, emoções e vínculos familiares. “O nosso diferencial é ouvir de verdade o sujeito por meio da sua queixa, entendendo como a criança e a família se relacionam com a alimentação no dia a dia”, explica Patricia.
Maria Clara complementa: “Nosso trabalho nutricional não é sobre restrição ou proibições. É sobre criar hábitos alimentares equilibrados, respeitando o crescimento e desenvolvimento da criança, sem culpa ou medo.”
O acompanhamento também considera que muitos padrões da infância podem se refletir na vida adulta. “Muitos adultos, quando começam a falar sobre sua história, mencionam memórias ligadas à forma como a comida era oferecida em casa ou às regras familiares. Entender esses padrões é fundamental para transformar a relação com a alimentação e prevenir que dificuldades se prolonguem ao longo da vida”, reforça Patricia.

Quando a experiência pessoal se transforma em compromisso profissional
A história do Espaço Serivê também nasce das próprias vivências de Patricia e Maria Clara. Patricia relembra que cresceu sob forte cobrança da mãe em relação ao corpo e ao peso — algo que, sem perceber, acabou reproduzindo na relação com a filha.
“Eu vivi a experiência de ter uma mãe controladora e, por muito tempo, repeti esse padrão com a Maria Clara. Só consegui parar quando ela mesma colocou um limite, mostrando o quanto isso a fazia sofrer. Foi um choque, mas também um aprendizado que transformou a minha forma de enxergar a clínica e o cuidado com a alimentação.”
Além disso, Patricia enfrentou desafios de saúde desde cedo: uma osteomielite aos quatro anos, que a deixou sem andar por um período, e um câncer de tireoide na adolescência, que marcou sua relação com o corpo e o peso. Essas experiências pessoais, somadas à sua longa trajetória clínica, a aproximaram dos temas ligados aos transtornos alimentares e à obesidade.
Já Maria Clara cresceu nesse ambiente de cobranças, mas encontrou seu próprio caminho ao se deparar, ainda no ensino médio, com o documentário Muito Além do Peso. “Eu fiquei fascinada com aquele filme e decidi que queria trabalhar com obesidade infantil. Foi isso que me levou à nutrição”, lembra.
Desde então, ela se aprofundou na área materno-infantil, realizou especializações e atua como voluntária em ambulatório de obesidade infantil do Hospital das Clínicas, além de seguir no mestrado sobre o tema.
Hoje, mãe e filha unem suas trajetórias pessoais e profissionais em um trabalho complementar. Enquanto Patricia traz o olhar clínico aliado à escuta e à psicanálise, Maria Clara soma a prática nutricional com base científica e atualizada.
O resultado é um espaço que acolhe não apenas crianças e adolescentes, mas famílias inteiras, com a sensibilidade de quem também já viveu, na própria história, as dores e os desafios ligados à alimentação.
Um propósito que vai além da clínica
O Espaço Serivê nasceu de uma inquietação profunda diante do avanço da obesidade infantil no Brasil. Para Patricia, basta olhar os números crescentes para perceber que estamos diante de um problema de saúde pública grave.
“Se nada for feito, o futuro será caótico, tanto para a sociedade quanto para as próprias famílias. Nosso propósito é oferecer orientação de qualidade, sem reduzir o tema a modismos ou discursos superficiais que acabam banalizando uma questão tão séria”.
Maria Clara compartilha da mesma visão, mas acrescenta uma preocupação que considera urgente: a forma como as redes sociais têm influenciado a relação das famílias com a alimentação.
“Em meio a um mar de informações, muitas vezes sem qualquer base científica, cresce a insegurança sobre o que é certo ou errado para os filhos. Nosso compromisso é justamente ser esse espaço de confiança, onde cada conteúdo divulgado e cada atendimento partem de ciência sólida e de experiência prática”.
A mensagem para as famílias
Para quem enfrenta o desafio da obesidade infantojuvenil em casa, o recado das especialistas é claro: não é uma caminhada fácil, mas ninguém precisa percorrê-la sozinho. “Não existem resultados imediatos ou soluções mágicas; o processo exige persistência, parceria e compreensão”, destaca Patricia.
Maria Clara acrescenta que a jornada pode ser longa, mas cada conquista traz mudanças que permanecem para a vida toda.
“A nutrição, quando integrada ao acompanhamento psicológico, à educação física e ao suporte clínico, torna-se um ponto de virada para a família. Mais do que dietas ou proibições, trata-se de promover uma verdadeira mudança de estilo de vida. E, embora não exista receita pronta, há sempre a certeza de que esse caminho pode ser construído de forma acolhedora, leve e duradoura”.
Conclusão
O Espaço Serivê acredita que a mudança de hábitos e a promoção da saúde infantil são resultados de um cuidado integrado, envolvendo crianças, famílias e profissionais de diferentes áreas. Cada passo é pensado para oferecer orientação baseada em ciência, com sensibilidade e respeito à singularidade de cada história.


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